terça-feira, 19 de agosto de 2008

Avanço nas minhas crenças
Reconheço a sua solidão
E me detenho em suas mãos.
O relógio antigo solidifica o tempo
E as suas palavras proclamam Deus.
Ambiciono a fuga.
A minha e a sua fuga...
Quero doar a você a liberdade de um pássaro.
Mas você prefere a prisão,
A prisão que não é só sua, mas de milhões.
Quero fugir,
Agora, preciso fugir...
Você me agarra e me estabiliza
Estou no chão
Enxergo sobre mim o teto sem manchas e longiquo
Abro os braços replicando Cristo na cruz
Sofro em silêncio.
Olho em sua direção e inicio a compreender a sua dor
A tristeza mergulha no seu corpo
E você busca conforto nas suas palavras que te aproximam de Deus.
Eu ignoro, nada ouço
Permaneço jogada no chão
Com os olhos molhados e os pensamentos despertos
Corpo estabilizado e cansado
Tento sair mas você me paralisa
E o chão permanece meu irmão.

Ouço os seus sussurros:
-É o fim...Fim dos tempos...
Sinto medo dessa proximidade com o nada
Messiânicamente você grita:
-Ele está prestes a chegar!
-Se prepare, é o fim!

Quero fugir e mais uma vez ignoro a sua loucura.
Tudo deixou de ter sentido
Já não há razão.
Como criança faminta você grita
E cada vez mais sou invadida pelo medo e desespero
Intacta e paralisada molho a minha face
Com um choro ansioso por consolo.

Lembro você ainda louco
E ainda preso
E inicio por compreender o desassossego.
Aquele que invade mente e corpo
Que anula o antes, nada existe antes dele.
E por isso precisa cuspir o agora
E vomita a sua doença.
Vomita em excesso
Me causando a estúpida sensação
De que tudo em você é vácuo.
Um saco vazio...
Depois daquele vômito
O louco se tornou um saco de pano vazio.

Danielle Soares
Porto, iniciado a 19/08 e finalizado a 27 de agosto de 2008

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

A pureza de uma casa

À minha irmã Naiara que no dia 29 completará 22 anos.Te amo...
A casa se encontra suspensa no ar, dá a sensação de que ela não toca no chão. É acizentada, tem janelas compridas, estreitas e espelhadas. É uma casa totalmente simples, solitária e suspensa para que possa alcançar o céu. Ela parece não ter base na terra, em compensação, está de mãos dadas com o azul infinito.
Estranha sensação...
Agora que a observo, os meus olhos se prendem cada vez mais nela, me dando a leve impressão de que ela também me observa gentilmente. Faz- se neste instante a comunhão entre o meu ser e a casa.
É antiga e protegida por um alto e extenso muro cor da lua. É um cinza marcado pelo tempo que guarda nessa cor a sua passagem pelos séculos. Da mesma forma que essa cor me causa a sensação do passado, do antigo ou do simples passar do tempo, as árvores finas e altas, as plantas e as flores colorem a paisagem e remtem à casa o sinal de vida e de presente.
- Que exuberância! Maravilhosa imagem que os meus sentidos conseguem absorver em mim.
Ela está fora do lugar, fora do espaço, porém, é dotada de autonomia e magnitude tão fortes que chega a anular todos os outros prédios e casas que estão a sua volta.
A casa não é pintada, penso até que nunca foi de outra cor a não ser dessa: cor de cimento, cor da pureza, cor da natureza bruta, cor daquilo que permanece virgem e intacto, cor da inocência e do desejo de vir a ser nossa. É uma casa de poucos porque não são todos os que param minutos a abservá-la para compreendê-la na sua crueza.
Olho as janelas e percebo que os detalhes têm ainda vestígios do verde que outrora foi vivo. E, é nesse exato momento, que chego a compreender que ela está coberta de histórias. Apesar da sua simplicidade e de sua forma discreta de estar no mundo, ela protegeu inúmeros corpos, objetos e camuflou infinitos segredos.
Permaneço parada observando a casa cor de cimento...
- Não, cor de cimento não! É cor da lua, porque ela deve ter o tempo do começo, do início e não o tempo do fim ou da transformação.
Do seu espaço ela preenche os meus olhos curiosos e me causa uma reviravolta no espírito, passo a sentir um forte desejo de fazer dela, unicamente minha.
Me imagino fotografando-a, fotos de todos os ângulos, justamente, para fazer dela a minha certeza do tempo que não cessa. Encaixo a paisagem e mentalmente fotografo essa imagem, eternizando-a em mim...
Os meus sentidos analisam tudo o que dela chega...Não captam nada para além daquele Todo que se resume na cor cinza, ou melhor, na casa cor de prata, cor da lua, melhor ainda, cor de lua prateada.
É dia, o sol está forte o que faz da casa ainda mais viva. É uma beleza extraordinária.
Penso na fotografia e nada mais...Devo ainda retornar aqui para levá-la comigo...
Descobri observando-a, o prazer da fotografia.
* No dia 06/08 fui passar a tarde na casa de uma amiga que há 2 meses se tornou "mamãe". A caminho de sua casa me deparei com a paisagem que descrevo no texto, com a tal "casa cinza" e naquele momento deixei de ouvir o que a Mônica falava e passei a viver a imagem que se apresentava diante dos meus olhos, por isso, não podia deixar de registrar e homenagear tal momento: Rico de beleza e de descoberta. Foi exatamente na Rua Monsanto (Porto).
Danielle Soares,
Porto, 06-07 de agosto de 2008
Nota: Devo lá retornar para fazer uma fotografia e expor aqui...no meu blog...